Mecanismo de defesa
Estes acessos de tosse são tramados. O corpo efetua um relevante esforço muscular para permitir exteriorizar o que não deseja que se mantenha no interior. Libertar cansa, mas liberta. Há um complexo sistema biológico organizado para nos proteger do que nos faz mal, como vírus ou bactérias indesejáveis. Sim: o que arde, cura. Mas o que arde, antes de tudo, arde. Se acordamos a meio da noite num caldo de febre e suores é porque milhares de anos de evolução acharam que, apesar de tudo, era melhor isto do que as outras imensas alternativas. Algures num passado filogenético, noutro galho da raiz humana, talvez tenham existido pessoas sem a competência para tossir ou para desenvolver febre: quando confrontadas com a intromissão de um rinovírus, ficariam embrulhadas sobre si mesmas, quietas e caladas, a gerir a energia em fuga, com as colónias virais a tomar conta do trato respiratório. Ainda há quem morra assim: em forma de um gato enrolado numa manta, sem olhar o mundo lá fora, numa respiração cada vez mais lenta que abana o corpo inteiro, num ronronar que entra pelas portas da morte em pés de lã.